Artigos | Postado no dia: 24 setembro, 2024

Responsabilidade de influencers pelos produtos e serviços que divulgam

Com a popularização das redes sociais e o crescimento do marketing digital, os influenciadores digitais passaram a ocupar um papel central na promoção de produtos e serviços. Suas postagens patrocinadas, as famosas “publis”, têm a capacidade de influenciar diretamente o comportamento dos consumidores, aproveitando-se da confiança estabelecida com seus seguidores.

No entanto, esse protagonismo também traz à tona uma questão crucial: até que ponto os influenciadores são juridicamente responsáveis pelos produtos e serviços que promovem? Siga com a leitura para compreender as nuances desse tema tão relevante nos dias de hoje.

Influenciadores como intermediários

Ao contrário dos anúncios tradicionais, veiculados na televisão e no rádio, onde celebridades são claramente identificadas como contratadas para promover um produto, a publicidade feita por influenciadores se integra de maneira mais sutil ao conteúdo do dia a dia dessas personalidades. Essa característica torna a distinção entre recomendação pessoal e publicidade mais nebulosa, gerando uma relação de confiança mais forte entre o influenciador e seu público.

Diante disso, surge o debate sobre a responsabilidade civil desses influenciadores, especialmente quando promovem produtos ou serviços que, de alguma forma, possam prejudicar seus seguidores.

Legislação aplicável: O Código de Defesa do Consumidor (CDC)

Embora os influenciadores digitais não se enquadrem no conceito clássico de fornecedor, conforme o artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), há uma crescente tendência de aplicabilidade da legislação consumerista a eles. Isso ocorre pela equiparação dos influenciadores à figura de fornecedores, com base no princípio da confiança e na teoria da aparência. Na prática, isso significa que os influenciadores, por promoverem ativamente a comercialização de produtos e serviços, poderiam ser considerados responsáveis pelos danos decorrentes desses anúncios.

O art. 38 do CDC estabelece que o ônus da prova da veracidade das informações publicitárias cabe ao patrocinador do anúncio. Contudo, a interpretação desse dispositivo pode estender a responsabilidade ao influenciador, principalmente quando sua atuação vai além da mera divulgação e interfere diretamente no processo de decisão de compra do consumidor.

Correntes doutrinárias

Existem diferentes correntes doutrinárias sobre a responsabilidade civil dos influenciadores digitais:

  1. Isenção de responsabilidade: Defendida por autores como Fábio Ulhoa Coelho, essa corrente sustenta que o influenciador, assim como as agências de publicidade, não deveria ser responsabilizado pelos danos causados por produtos ou serviços ilícitos, exceto quando houver expressa assunção de responsabilidade. Nessa visão, a responsabilidade seria exclusiva do fornecedor-anunciante.
  2. Responsabilidade subjetiva: Outra corrente entende que a responsabilidade dos influenciadores seria subjetiva, isto é, apenas poderiam ser responsabilizados mediante a comprovação de dolo ou culpa. Assim, seria necessário demonstrar que o influenciador agiu de forma negligente ou dolosa ao promover o produto.
  3. Responsabilidade objetiva e solidária: Defendida por Scartezzini Guimarães, essa corrente mais rigorosa entende que o influenciador digital deveria ser responsabilizado de forma objetiva, em conjunto com o fornecedor, com base na teoria do risco profissional. A justificativa para isso seria o fato de que os influenciadores se beneficiam financeiramente das publicidades e, em muitos casos, são remunerados com base nas vendas geradas pela sua divulgação.
  4. Responsabilidade condicionada: Uma visão mais moderada, proposta por Rizzato Nunes, defende que a solidariedade entre o influenciador e o fornecedor só existiria em situações onde o influenciador participou ativamente do processo de divulgação, e a enganosidade do produto fosse evidente. Caso a falha do produto ou serviço seja atribuída exclusivamente ao fornecedor, o influenciador poderia ser isentado.

O que os tribunais têm entendido nos casos concretos?

Os tribunais brasileiros ainda estão construindo uma jurisprudência consistente sobre o tema. No entanto, já existem decisões que apontam para a responsabilização dos influenciadores. Um exemplo disso é o julgamento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), que condenou uma influenciadora digital por sua participação na promoção de um sorteio de veículo automotivo em suas redes sociais. O tribunal entendeu que, ao vincular sua imagem ao sorteio, a influenciadora participou do ato de maneira direta, assumindo a responsabilidade pelo evento.

Por outro lado, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC) apresentou entendimento de que é necessário analisar o grau de envolvimento do influenciador na cadeia de consumo. Caso o influenciador tenha apenas atuado como um divulgador, sem estar diretamente envolvido com o produto ou serviço, ele poderia ser isento de responsabilidade.

Fatores que impactam a responsabilidade do influenciador

A análise da responsabilidade civil dos influenciadores digitais deve levar em consideração fatores como o grau de evidência da ilicitude do produto ou serviço e o nível de sofisticação do influenciador. Além disso, produtos ou serviços cuja ilicitude é clara, como a venda de produtos falsificados ou ilegais, podem implicar uma responsabilidade mais direta por parte do influenciador, enquanto situações mais complexas, como questões tributárias envolvendo fornecedores, exigem uma análise mais detalhada

Conclusão

A responsabilidade civil dos influenciadores digitais pelos produtos e serviços que divulgam é um tema em evolução. A ausência de uma regulamentação específica leva a que os tribunais brasileiros tenham que decidir caso a caso, considerando o grau de envolvimento do influenciador, a natureza do produto ou serviço anunciado e a confiança depositada pelos consumidores. Em um ambiente de rápida transformação, é essencial que influenciadores estejam cientes das implicações legais de suas publicidades e busquem atuar com transparência e diligência na escolha dos produtos e serviços que promovem.

Este texto tem caráter meramente informativo e não deve ser considerado como substituto de uma consulta com um advogado devidamente qualificado para obter orientações precisas e adequadas à sua situação específica. Caso haja dúvidas, não hesite em entrar em contato conosco. Estamos disponíveis para auxiliá-lo.